Saneamento: Agora vai?

*Édison Carlos

Prioridade real ou apenas a mais nova prioridade eleitoral?

Por décadas renegado à condição de “primo pobre” da infra-estrutura no Brasil, o saneamento está vivendo dias atípicos. Esteve e está na boca dos candidatos, dos eleitos e daqueles que ainda serão testados nas urnas do segundo turno, o que não nunca havia ocorrido na história.

O saneamento básico, que pela esfera governamental abrange os serviços relativos a lixo urbano, drenagem, água potável e coleta e tratamento dos esgotos, continua perdendo feio como prioridade dos investimentos, principalmente a coleta e tratamento dos esgotos. Atualmente, enquanto os serviços de água e energia elétrica, por exemplo, estão disponíveis para a maior parte da sociedade, mais da metade da população brasileira ainda não possui coleta de esgotos. E do esgoto coletado, apenas 1/3 é tratado, ou seja, continuamos num binômio de doenças e impacto ambiental.

Estudos realizados pela FGV - Fundação Getúlio Vargas para o Instituto Trata Brasil mostram que crianças até 4 anos acometidas por doenças vindas do esgoto, principalmente diarréias, aprendem menos na escola e faltam mais às aulas. Mesmo adultos em contato com o esgoto são acometidos de um número maior de infecções provocando faltas ao trabalho e maiores custos à sociedade.

A mais recente pesquisa feita nesta parceria FGV – Trata Brasil, chamada “Benefícios Econômicos da Expansão do Saneamento Brasileiro” mostra que, por ano, 217 mil trabalhadores precisam se afastar de suas atividades devido a problema gastrointestinais ligados a falta de saneamento. A cada afastamento perde-se 17 horas de trabalho em média e a probabilidade de uma pessoa com acesso a rede de esgoto faltar as suas atividades por diarréia é 19,2% menor que uma pessoa que não tem acesso à rede. Por outro lado, ao ter acesso à rede de esgoto, um trabalhador aumenta sua produtividade em 13,3% permitindo assim o crescimento de sua renda na mesma proporção. 

Talvez este descaso tenha explicação pelo fato do saneamento ter sido colocada no rol das “benfeitorias invisíveis”, da antiga e desatualizada lógica eleitoral de que “obra enterrada não dá votos”, e assim a coleta e tratamento de esgotos foram esquecidos pelo poder público por décadas. A criação do Ministério das Cidades em 2003 e a aprovação da lei 11445 em 2007 depois de 20 anos de tramitação no Congresso, trouxeram um pouco de luz e ordem ao setor além da definição de regras claras capazes de trazer de volta investimentos mais expressivos, públicos e privados. Mas foram décadas de desinteresse que trouxeram o cenário atual onde, segundo próprio Ministério das Cidades, são  necessários cerca de R$ 270 bilhões para atingirmos a universalização dos serviços de água e esgoto, sem contar neste número o aumento da população e a reposição de matérias e equipamentos dos sistemas existentes já próximos do final de suas vidas úitl. Embora os investimentos em saneamento tenham sido retomados desde 2007 com o PAC - Programa de Aceleração de Crescimento, mantendo-se o montante de investimento anual de R$ 10 bilhões previstos nos PAC 1 e PAC2 precisaremos ter ao menos 7 PAC´s consecutivos para que todos os brasileiros tenham acesso aos serviços.

As empresas operadoras destes serviços, públicas ou privadas, do seu lado, também necessitam agregar melhores formas de gestão, técnica e financeira. Trabalhar com sistemas e materiais que minimizem as perdas e vazamentos, de forma a ampliarem suas capacidades para tomadas de recursos e assim conseguir ampliar as redes de coleta e tratamento.

Por tudo isso, o Brasil não pode esperar mais, nem correr o risco de que a luz colocada sobre o saneamento seja apenas uma prioridade eleitoral momentânea, ainda mais agora, passado o primeiro turno das eleições, onde ficou provado que grande parte da população está, sim, atenta aos temas ligados à saúde, à sustentabilidade e à preservação ambiental. Coleta e tratamento de esgotos é responsabilidade do município, portanto, do Prefeito, mas é certo que os eleitores estão atentos e saberão cobrar o Governo Federal, governadores, deputados e senadores, caso esses não transformem esse novo discurso em realização real.

*Édison Carlos é Presidente Executivo do Instituto Trata Brasil

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