O Instituto Trata Brasil é composto por um grupo de embaixadores(as) que além de representar a instituição, apoia as ações pela universalização do saneamento. São 30 nomes, entre eles estão pesquisadores, especialistas em saneamento básico, figura importante da literatura brasileira, atletas olímpicos, médicos e nomes renomados do direito brasileiro assim como, Dra. Consuelo Yoshida.
Dra. Yoshida apresenta ampla vivência profissional na área ambiental e da justiça, sendo desembargadora Federal do TRF 3ª Região, Mestre e Doutora pela PUC/SP, com a tese 'Poluição em face das cidades no Direito Ambiental Brasileiro: a relação entre degradação social e degradação ambiental'.
No texto do blog de hoje, conversamos com a desembargadora, professora e embaixadora do Instituto Trata Brasil, sobre saúde, legislação e saneamento básico, além das projeções para o futuro dos serviços de água e esgoto no país. Confira!
- O que pode ser feito para convencer a população de que precisam cobrar diariamente por saneamento básico?
Eu acho que a população não sabe da importância do saneamento. Como todo mundo sabe, as pessoas preferem rua asfaltada, entre outras coisas, que, pelo contrário, impedem que nós tenhamos uma qualidade de vida nas cidades. A impermeabilização da cidade está em discussão hoje pelo aumento da precipitação das chuvas. Então, eu acho que a população não tem consciência, porque é como todo mundo brinca, né? Fica tudo enterrado e aí ninguém vê, e o prefeito também não dá prioridade por conta disso. Acho que temos que conscientizar de que a água tratada e esgoto canalizado são fundamentais para a saúde da população. Verminoses, tantos problemas que acontecem, que eles não têm nem noção. As praias contaminadas, diarreias, hepatites, a população não sabe que isso tudo deriva da falta ou da insuficiência de saneamento.
- Como a política de habitação está associada ao saneamento básico?
Por que que temos tantas ocupações irregulares em beira de mananciais como temos aqui? É falta sinceramente de conscientização e, por isso, não adianta você só querer retirar de lá a população. Primeiro, deve-se tentar impedir que elas ocupem, porque depois que instalado a ocupação irregular principalmente à beira de mananciais é dificílimo. Aí tem problema político, tem problema da mobilização da igreja a favor da moradia, então temos que tentar dar mais dignidade para essas pessoas. Então, com esse fluxo de pessoas, a gente vai tendo cada vez mais problemas. Tudo isso colabora para ocupação irregular, só que isto tem que ser muito rígido onde é essa ocupação irregular. Já que a gente não consegue dar moradia para todos, então vamos tentar ver e impedir que se prolifere. Há uma ocupação desenfreada nas regiões de mananciais aqui em São Paulo, não deve ter incentivo e, pelo contrário, cidadania gente. Vamos ter atitudes e ver o que é bom para todos e não usar como palanque para políticos, para ONGs, até para movimentos religiosos. Então, primeira coisa, o que que é melhor para a população? Não é qualquer lugar para habitar se não todos sairão prejudicados.
- Qual a maior deficiência do país hoje em relação ao saneamento básico, são ausências de leis ou deficiência de fiscalização?
Eu acho que ausência de lei não é. Acabamos de discutir um novo marco com todas as suas dificuldades, sabemos que precisamos levar o saneamento para todas as regiões, visando a universalização. Hoje, as regiões mais precárias são a Norte e Nordeste, mas esse tratamento que é dado depende de cada região, nós não podemos deixar de priorizar em qualquer instância de governo, seja federal, estadual ou municipal, as políticas de saneamento. O orçamento é uma grande dificuldade, a gente sabe muito bem qual a intenção do programa de governo quando vemos o orçamento previsto, por isso, nós temos que batalhar para que os prefeitos e governadores deem mais atenção ao saneamento. E por isso que se cogita a privatização, porque a ineficiência do Estado não é na fiscalização, eu acho que é na própria implementação do saneamento básico, junta tudo, inclusive a fiscalização, quantas ligações clandestinas são feitas, as perdas de água, o desperdício. Então é assim, planejamento e prioridade pelos diferentes governos e com certeza com parcerias público privadas, porque não tem mais como o poder público arcar sozinho.
- Reconhecer os impactos na saúde pública não deveria ser o indicador primordial para se ter saneamento básico nas cidades?
É direito à saúde, não é a questão ambiental em primeiro lugar, está diretamente ligada com saúde. Eu mencionei os tipos de problemas que são comuns onde não tem saneamento, essas crianças com deficiências, pois estão cheias de verminoses, alimentam-se com aquela água imprópria para cozimento, nadam. A saúde dessa população está sendo prejudicado, e agora veja, não é só a população carente, mas sim toda a população do Rio de Janeiro, prova fundamental de que havendo contaminação antes de ser distribuído a água, a população inteira sofre.
- Qual a sua projeção para o futuro do saneamento básico do país? Um dia todos terão acesso a esses serviços igualitariamente?
Eu acho que isso é uma realidade cada vez maior nos estados brasileiros que tem maior desenvolvimento econômico e social, Sul, Sudeste e Centro-oeste, mas vai rareando essa possibilidade de um acesso universal devido à distância entre cidades, e aí sempre é muito grande, então quando existem cidades mais próximas, como essas regiões com conurbação, megalópoles, então passa até para o estado. Nessas grandes cidades é problema de periferia, nessas grandes cidades, a periferia está muito mal servida de saneamento básico. À medida que você distância do centro da cidade, as megalópoles só amealham as pessoas que não conseguem inclusão social, inclusão no trabalho e acabam morando cada vez mais nas periferias e a partir disso não apresentam os serviços de saneamento básico adequados, que alcance toda essa população. Então, eu acho que não é só nessas regiões mais longínquas, com carência de todos os modos, mas principalmente também nas periferias das grandes cidades.
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